Imagine assistir um páreo do Jockey Club do Paraná. Qualquer páreo, mas sendo possível apenas assistir as imagens. Por mais que você conheça as fardas e os cavalos isso se tornará algo extremamente chato e sem emoção. Agora faça ao contrário. Vá ao YouTube, abra o vídeo de uma corrida do Hipódromo do Tarumã, feche os olhos e imagine a corrida apenas ouvindo a narração. Muito mais emocionante, não é mesmo?

E isso só é possível graças a um dos maiores abnegados da crônica turfística paranaense. Há 25 anos trabalhando com o turfe, desde seu início como assistente de transmissão na Rádio Capital, Gerson Borges de Macedo vem sendo uma das principais vozes do turfe paranaense. Há mais de 15 anos ele é o principal narrador do Jockey Club do Paraná, além de presidente da Associação dos Cronistas de Turfe do Paraná e uma das figuras mais importantes de nosso esporte.

Claro que com todas estas credenciais, Gerson é a personalidade do turfe de hoje.

Como Gerson mesmo cita, ser narrador de turfe é um dom. Você pode até aprimorar suas técnicas, mas aquilo nasce com você. E foi ainda criança que Gerson começou a expor este seu lado narrador. Sua família já frequentava o Jockey quando ele era criança e se divertia jogando bola no gramado. Porém, quando chegava em casa se juntava com seus primos e brincavam de “equipe de transmissão”. Gerson conta que sua mãe ficava louca ao ouvi-lo narrando páreos imaginários o dia inteiro.

“Nós frequentávamos muito o Jockey, já que as opções de lazer não eram tantas quanto hoje”, conta Gerson. “Eu conheci o turfe ainda criança e quando fiquei um pouco mais velho acompanhava tudo, era apaixonado. Acompanhava os jornais, as rádios Cruzeiro do Sul e Santa Felicidade, hoje já extintas e até os programas de televisão. Enfim, sabia tudo sobre o turfe. E tinha o sonho de um dia poder fazer parte daquelas equipes, então em casa ficávamos eu, meu irmão e meu primo brincando de equipe de rádio. Era o dia inteiro narrando corridas de páreos imaginários.”

E este sonho permaneceu com Gerson durante grande parte de sua vida. Aos 25 anos, já casado e frequentando as corridas, ele se lembra de algo que mudou tudo e lhe deu a sonhada oportunidade . Ele estava ouvindo os comentários da Rádio Capital, que contava com Edson Ruck e Dalton Mehl Antrusko, quando algo dito no programa lhe chamou a atenção.

Além de narrador do Jockey, Gerson presta grande serviço ao CRC-PR.

“Eu estava em uma domingueira lá no Jockey, ouvindo os comentários”, relembra Gerson. “O Edson e o Dalton estavam entrevistando o Pierre Vaz, quando ele disse que o turfe precisava de renovação. O Edson interrompeu e disse que a crônica também precisava de renovação. Isso mexeu comigo. Eu com tanta vontade de ajudar, sonhando tanto com aquilo. Na hora sabia que precisava ir atrás para fazer parte daquela equipe.”

E foi assim que tudo começou. Na época Gerson foi atrás do endereço e enviou uma carta pedindo uma oportunidade. Logo veio a ligação de Dalton Mehl Antrusko e em em menos de duas semanas ele estava empunhando o microfone da Rádio Capital. No início era um auxiliar, passando o resultado dos páreos, retrospecto e outros dados. Mas Edson Ruck o queria como narrador, então depois de muito treino e claro, nervosismo na estreia, Gerson narrava seu primeiro páreo, há quase 24 anos.

“O Edson me disse que precisava de um segundo narrador, já que ele estava sozinho. Então juntou ‘a fome com a vontade de comer'”, lembra Gerson. “Era meu sonho e existia a necessidade da equipe. E aí comecei a treinar, treinar até que em 1995 eu estreei. Foi um páreo de domingo com seis animais, onde quem venceu foi o cavalo Erótico. Terminou a prova e eu estava mais suado que os cavalos, tamanho o nervosismo. E ali comecei a narrar um ou dois páreos por reunião, até que começamos a dividir eu e o Edson narrando para a Rádio Capital e para o sistema interno do Jockey.”

Gerson ao lado da equipe da TV Turfe Paraná – José Luis Lobo e Vaccari Neto – em ocasião da Pegasus Brasil.

Mas se engana quem pensa que a vida de narrador é fácil. Gerson pegou uma fase que as corridas aconteciam uma vez por semana, tendo que trabalhar muito tempo sozinho. A dificuldade que os narradores tem é enorme, sendo que eles precisam de uma preparação grandiosa a cada prova. A responsabilidade é enorme e erros não são admitidos. Gerson conta que está muito próximo dos 5 mil páreos narrados e consegue contar nos dedos os páreos em que errou. Mesmo assim, as críticas são enormes perto dos elogios.

“A dificuldade de se encontrar narradores é grande. A cobrança é muito grande com os profissionais. Eu narrei quase 5 mil páreos e devo ter errado uns 10. Eu lembro até hoje as cobranças em relação a estes erros. Nos outros 4.990 recebi um ou outro elogio”, desabafa Gerson. “Na verdade se aventurar a isso é um dom mesmo, porque financeiramente não compensa e o reconhecimento positivo é pequeno. Eu por exemplo, estou há 25 anos narrando e gostaria de ver mais reconhecimento ao trabalho dos  repórteres e narradores.”

Gerson é o presidente da Associação dos Cronistas de Turfe do Paraná. Há pouco foi fundamental para o retorno de Vaccari Neto as narrações, uma vez que o mesmo estava afastado e o Jockey só contava com um narrador. Claro que Gerson vê coisas que podem melhorar, no entanto, alguns momentos e coisas que ele viveu marcaram sua vida para sempre.

Um destes momentos foi a vitória de Mr. Pleasentfar, no Grande Prêmio Paraná de 2000. Não que este tenha o sido o cavalo que mais marcou Gerson nestes 25 anos. Ele conta que tem um carinho especial por Dom Tibagi, um tordilho do João Carlindo que ele guarda a foto até hoje. Também Grão de Bico e alguns outros. Mas o crioulo do Haras Garcez Castellano marcou Gerson para o resto de sua carreira, afinal, foi o primeiro Grande Prêmio Paraná que ele narrou.

“O grande momento foi a narração do meu primeiro Grande Prêmio Paraná, que era um sonho de infância e adolescência”, conta Gerson. “Hoje eu já perdi as contas de quantos eu narrei, bem mais de dez. O primeiro foi  especial, em 2000 com o cavalo Mr Pleasentfair, do Garcez Castellano. Ali eu podia parar… depois de cruzar o disco eu acho que poderia parar, pois estava realizado como narrador. Era um sonho que eu tinha e realizei. A gente ainda continua nesta vida de narrações, não se sabe até quando, pois nunca parei para pensar. Um dia a gente sabe que vai cruzar o disco final.”

Gerson tem uma grande responsabilidade em deixar um legado para as próximas gerações de narradores. O trabalho árduo e desgastante continua. Como ele citou, trabalha com Vaccari Netto como seu sucessor, além de esperar que mais nomes surjam. O apoio a Associação de cronistas é algo que Gerson sente falta, uma vez que cada vez mais segmentado e sem espaço nas grandes mídias, é difícil que novos profissionais apareçam.

No currículo, além das passagens pela Rádio Capital e seus 25 anos a frente do Jockey Club do Paraná como narrador, Gerson se orgulha da parte escrita. Em uma época que a crônica contava com espaço nos periódicos impressos, era Gerson quem escrevia no Jornal do Estado, hoje Bem Paraná. Ele ainda teve uma das colunas mais marcantes do Jornal do Turfe, a “Pingando Azeite”, onde Gerson fez muito sucessos com seus contos sobre a crônica turfística.

“Meu sonho hoje como narrador é poder encerrar minha participação de cabeça erguida, como entrei, orgulhoso pela função que exerci. Só fiz amigos no turfe, foram pouquíssimas pessoas com quem eu tive dificuldade de relacionamento e não me arrependo pois o tempo provou que eram pessoas que não mereciam o meu respeito e consideração”, continua Gerson. “Fiz o que pude, da melhor maneira que pude para colaborar com o turfe paranaense e brasileiro. Seja como narrador ou como chefe de equipe, também no Jornal do Turfe, Jornal do Estado e por onde eu passei. Tenho a certeza que a hora que me aposentar das narrações sairei com a missão cumprida e muito bem cumprida.”

A gente espera que esta despedida ainda demore pelo menos uma década, pois hoje é um deleite para os aficionados poder ouvir as narrações de Gerson Borges de Macedo. Um apaixonado que de uma criança “brincando” de narrar páreos se tornou na grande voz do Jockey Club do Paraná da última década. Que nós todos possamos ouvir ainda milhares de vezes Gerson contando como os cavalos que aqui correm “vão para a foto da vitória”. Sem a menor dúvida, uma das grandes personalidades do turfe.