O Jockey Club do Paraná teve em sua história grandes jóqueis. Seria injusto tentar citar nomes desde Pedro Gusso Filho até os que atuam tão brilhantemente até hoje. Muitos foram formados aqui e ganharam o mundo. Outros, chegaram aqui em busca de uma oportunidade e construíram sua família dentro do Hipódromo do Tarumã.

E nosso personagem de hoje é um deles. Gaúcho, começou montando em canchas retas e logo que aportou aqui quase desistiu. O motivo, duas suspensões seguidas que o deixaram fora das pistas por 45 dias. Mas com muita perseverança e um talento inigualável, ele continuou e se tornou um dos grandes nomes do turfe paranaense.

Estamos falando de Edgar Barcelos de Araujo, jóquei que venceu oito estatísticas e se consagrou com Kanaloa no Grande Prêmio Paraná. Até hoje em nosso turfe, agora como treinador, Araujo dividiu um pouco de suas histórias de uma época marcante do turfe paranaense.

O começo foi no interior do Rio Grande do Sul, nas canchas retas do interior daquele estado. Aos dez anos, Araujo assistia seu pai treinar cavalos e seu irmão montar. Na época, uma égua chamada Bibiane foi inscrita em uma penca no interior do estado. Bibiane enfrentaria animais muito bons, mas ao contrário das adversárias que iam com cinquenta quilos, ela poderia correr com peso livre.

Então o Seu Mariano, pai de Edgar decidiu colocar o menino em cima de Bibiane, que com apenas 30 quilos “no lombo” ganhou com muita vantagem. Dali em diante Araujo começou a morar em Alegrete, a convite do Haras Gentil Carlesso. Sua carreira começou ali, depois se estendendo para Palmeiras das Missões e São Gabriel.

Edgar Araujo sempre teve talento para provas de velocidade.

Edgar Araujo era bom na reta. Montando para importantes haras venceu nas mais diversas canchas retas do Brasil. Até que em 1986 ele conheceu Baltasar Correa, que treinava os animais do Gentil Carlesso no Tarumã. Araujo foi convidado e aceitou o desafio de montar em um hipódromo. Em julho de 1986, ele aportava no Jockey Club do Paraná.

Sua primeira montaria foi Espectro Doc, que correu uma penca no Tarumã. Araujo já tinha grande experiência, tendo montado até no Uruguai para o Haras Gentil Carlesso. Porém, ele não conhecia o regulamento utilizado aqui e depois de um desvio de linha na reta de chegada levou 60 dias de suspensão. E esta não foi a única.

“Na primeira que eu montei aqui levei 60 dias de suspensão”, conta Edgar Araujo. “Eu montava o Espectro Doc em uma penca que era 200 metros com trilhos e depois aberto. Eu já havia montado no Uruguai e Argentina e era assim, mas lá valia desviar o trajeto após o fim dos trilhos. Eu desci do cavalo e deram sino. Eu nem sabia o que era esse tal de sino. Não fomos desclassificados, mas me deram 60 dias de suspensão.”

Araujo venceu com várias fardas icônicas do turfe paranaense. Uma delas a do Haras Curitibano.

Araujo conta que depois a suspensão foi reduzida para 30 dias. No entanto, alguns dias após ele novamente foi suspenso, na Prova Especial Polícia Militar do Estado do Paraná. Foram mais 15 dias de suspensão e o jovem, na época como ele mesmo diz “meio nervoso”, quase arrumou as malas e voltou para Alegrete.

Mas Araujo ficou no Tarumã e em 1987 venceu pela primeira vez as estatísticas. Antes, uma das derrotas mais dolorosas, quando montando Roscado perdeu a prova de velocidade para Fort Whort.

“A minha pior derrota foi com um cavalo bom da reta, o Roscado”, lembra Araujo. “Perdi para o cavalo do finado João Carlindo, Forth Worth. Perdi por falta de experiência, passei reto na entrada da reta porque o cavalo desgarrou. Se eu tivesse vindo por fora tinha ganho, mas eu quis voltar para dentro e perdi por meia cabeça. Mesmo vindo da reta, nunca ganhei o páreo de velocidade. Perdi duas vezes na foto.”

Com a farda do Haras J.B.Barros vieram grandes vitórias.

E nessa época surgiu uma farda muito tradicional em sua vida, que fez com que ele vencesse as provas mais importantes da carreira. Defendendo a tradicional farda “vermelha e preta em listras horizontais” do Haras J.B.Barros, Araujo conseguiu mostrar seu talento também fora de Curitiba.

“Na época quem montava para o J.B.Barros era o Mauri Santos, mas ele estava meio pesado e eu era mais leve. O Laertes me convidou para ir trabalhar os cavalos deles no haras uma vez por semana. Eles gostaram e me contrataram, pagando um salário mensal. Naquela época eles tinham muitos cavalos, todos bons, que me ajudaram muito. Sou muito grato ao Doutor Jael pelas oportunidades que tive.”

Nesta época Araujo começou a ter oportunidade de montar fora de Curitiba. Um animal em especial foi King of Rivers, que ele tem uma ótima história. Naquele tempo as chamadas de grandes prêmios eram formadas mesmo com pouquíssimas inscrições. E em uma delas Araujo corria sozinho com King of Rivers. O mais incrível, ele conta que o cavalo quase perdeu para ele mesmo.

Araujo com King Of Rivers no Grande Prêmio São Paulo (foto Porfirio Menezes).

“Eu montei o King of Rivers uma vez aqui um páreo sozinho e quase perdi. O cavalo era muito brabo, não gostava de galopar, cravava. No haras para ele trabalhar tinham que ir dois cavalos juntos, um de cada lado. O único que conseguia galopar ele era o Manoel, cortejador do haras, que hoje trabalha no Santa Maria de Araras.”

“Eu larguei e fiquei pensando: ‘Esse cavalo vai cravar comigo’. Ele largou sozinho nos dois mil metros e na primeira curva começou a abrir, era um cavalo muito grandão, brabo. Então eu tirei o pé do estribo e fui bem devagarzinho na reta oposta. Lá nos 800 metros finais ele parou. Como eu conhecia ele, sabia que se eu chicoteasse ele iria empinar e voltar para os 1.700 metros. E ali ele iria empacar e não sairia mais, só puxado. Então coloquei o chicote embaixo da perna e fui batendo com a rédea no pescoço dele. Ele olhou para um lado, para o outro e voltou a galopar. Estribei na reta para cruzar o disco e depois não consegui pará-lo. Quase deu mais uma volta (risos).”

Mal sabia Araujo que o grande animal que ele montou da geração “K” do J.B.Barros era uma égua. Na verdade ele sabia, pois conhecia Kanaloa desde potranca. Segundo Araujo, a égua filha de Cavo Doro e Blue Lucky (Corpora) era muito dócil e confirmava os trabalhos, dando a ele grandes vitórias tanto no Tarumã quanto em Cidade Jardim.

Com Kanaloa foram duas vitórias no Clássico Primavera (Listed), o Grande Prêmio 25 de Janeiro (G2) e o Grande Prêmio Paraná (G1).

“A Kanaloa era meu xodó. Égua boa, mansa, certinha e que sempre confirmava os trabalhos dela. Sempre trabalhava muito bem no haras. Ela corria muito na grama, então no começo eu montava pouco. O Luiz Duarte e o Gabriel Menezes montavam ela, mas não se acertaram muito. Eu conhecia ela desde potranca e o Doutor Jael me deu ela para montar.”

“Eu já tinha vencido com ela em São Paulo e assinei para montá-la no Grande Prêmio Paraná. Nós demos sorte que choveu aquele dia e o cavalo que era favorito – Cigano Road – não teve um percurso muito favorável. E deu tudo certo para a Kanaloa e para mim, pois vencemos a principal prova do estado. Na grama ela corria o dobro, mas mesmo assim venceu o Grande Prêmio 25 de Janeiro em São Paulo.”

Job di Caroline foi um dos craques que Araujo montou.

Alguns nomes de cavalos clássicos que ele montou vem a sua mente. Como Golpe de Mestre, do Haras Andorinha, Bigckoa, que ele venceu duas das três provas da tríplice coroa, El Astral, além de muitos cavalos do Haras Girassóis, Haras Valente e Haras Curitibano. Um deles, o craque Job di Caroline.

Mas a carreira de jóquei de Araujo foi minada por um problema de saúde. Vendo a idade chegar e com problemas na coluna, mais especificamente na sétima vértebra, ele viu que a carreira estava acabando. O problema começou a refletir em seu braço direito, tendo que deixar as pistas aos poucos. A transição para a função de treinador aconteceu em uma conversa com o amigo e também ex-jóquei, J.S.Rosa.

Hoje Araujo é treinador, já tendo conquistado o Grande Prêmio Paraná.

“Eu estava lá em casa com o Piratinha (J.S.Rosa) e disse que tinha vontade de começar a treinar. Ele tinha a cocheira e eu e ele começamos juntos. Arrumamos uns cavalos e os proprietários começaram a me dar uma mão. Vários proprietários começaram a nos ajudar e estamos aqui até hoje.”

Como treinador, Araújo também conquistou o Grande Premio Paraná, com a farda do Stud Malta de Jaburu Vip. Contudo, a grande vitória dele foi poder ver seu filho, Rafael Araujo, montando e vencendo no Hipódromo do Tarumã.

“Ver meu filho montando foi muito bom. O Rafael não era para ser jóquei, ele era jogador de futebol. Ele treinava no Coritiba e lá tomou muito suplemento para crescer, porque ele era pequeno. Ele cresceu demais e teve problemas no joelho. Ele tinha tudo para ser um excelente jóquei, mas a mãe dele não queria. Até que devido ao problema no joelho ele parou de jogar e começou a me acompanhar no Jockey, quando o pessoal aqui começou a incentivá-lo a montar. Ele entrou na escolinha e logo estava nas pistas. Ele montou bem, ganhou, só não teve mais destaque porque lutava muito com o peso. Foi um bom jóquei.”

Na carreira foram várias vitórias. O Grande Prêmio Paraná, o Clássico Primavera, o Derby Paranaense, além de diversas provas clássicas no Tarumã e em Cidade Jardim. Uma hegemonia que durou quase uma década, em uma época que os jóqueis paranaenses tinham que “brigar” contra grandes nomes de fora que aqui vinham montar, como Antonio Bolino, Luiz Duarte, Nelito Cunha, Claudio Canuto e Gabriel Menezes.

Em uma geração que contava com José Cardoso, Valdeci Matos, Antonio Cassante, Oberdan Pereira Filho, Ivo Oliveira, Emerson Gonçalves Cruz e tantos outros bons profissionais, Edgar Barcelos de Araujo marcou seu nome na história, sendo merecidamente lembrado como uma das grandes personalidades do turfe paranaense.